Há respostas que, por alguma ironia da vida, demoram a nos chegar. Anos atrás, quando li pela primeira vez, o romance Mil Tsurus (1952), de Yasunari Kawabata, marcou-me e intrigou-me, por ser narrativa sucinta, simples, quase minimalista, não obstante seu tema seja atravessado de algo corrosivo: a atmosfera de reconstrução do Japão após a 2a Guerra. Contudo, não tinha resposta para essas impressões estéticas preliminares.
A cerimônia do chá, tão tradicional na cultura japonesa, permeia o romance de Kawabata. Só que aos olhos de um ocidental pode simbolizar apenas mais um elemento do ambiente da narrativa. E, na verdade, a cerimônia do chá transcende o significado de um ritual. Está prenhe de valores filosóficos, estéticos e espirituais.

Somente agora, após a leitura de Wabi-sabi para artistas, designers, poetas e filósofos, do artista e escritor estadunidense Leonard Koren (1948- ), lançado em 2019 pela editora Cobogó, é que sinto soprar boas sugestões para uma releitura de Kawabata, com olhar renovado.
Koren, desde o título do livro, direciona o diálogo sobre wabi-sabi para artistas, designers, poetas e filósofos. No entanto, a amplitude do wabi-sabi vai muito além desse público.
A arte, a poesia, a filosofia são dimensões inerentes ao wabi-sabi. A obra de Koren, na exposição do que vem a ser essa arquissecular “filosofia” japonesa, conserva a concisão, a simplicidade, de tal modo que reproduz na feitura do livro parte dos princípios do próprio wabi sabi.
“O wabi-sabi é a beleza das coisas imperfeitas, transitórias e incompletas”. Ao abrir o livro de Koren, o leitor irá se deparar com esse conceito. Pouco a pouco, o fio vai se desenovelando, para notarmos que o wabi-sabi não se encerra em conceito único e fechado. Pelo contrário, segundo Koren, nem mesmo entre os japoneses o sentimento do wabi-sabi poderia ser explicado com exatidão. É dos raros conhecimentos e preceitos espirituais que se deve vivenciar acima de tudo e de todas coisas passageira de nossa vida terrena, para apreender seus sentidos.
Leonard Koren imergiu na vida japonesa durante os anos de 1980. Desde então, publicou vários trabalhos sobre a cultura popular japonesa, entre os quais se destaca esta obra de referência, Wabi-sabi para artistas, designers, poetas e filósofos, que expõe essa teoria estética nipônica.
Graças a esse livro, estou eu aqui a fazer planos para reler Kawabata e desbravar a literatura japonesa, notando como a estética e a espiritualidade do “wabi-sabi” orientam tantas realizações artísticas e literárias dos japoneses, há muitas eras.
RAFAEL VOIGT, editor da {voz da literatura}.
KOREN, Leonard. Wabi-sabi: para artistas, designers, poetas e filósofos. Tradução de Marília Garcia. 1. ed. RJ: Cobogó, 2019. 108 p.
Comments