Alcir Pécora, professor titular de teoria literária da Unicamp, conversou, por e-mail, com a revista {voz da literatura} sobre a nova edição de Máquina de Gêneros (Editora Unicamp e EDUSP), obra de referência para o estudo de gêneros retóricos-poéticos que circularam entre os séculos XVI e XVIII. Cartas, tratados, máximas, rondós, madrigais, epopeia, sermões, são alguns dos gêneros estudados por Pécora a partir de autores como Padre Manuel da Nóbrega, Padre Antônio Vieira, Luís de Camões, Tomás Antônio Gonzaga, Silva Alvarenga, Bocage, La Rochefoucauld, Giovanni Della Casa, Baldassare Castiglione.
Após quase 18 anos sai a segunda edição de "Máquina de gêneros". O que significa para você essa reedição?
De fato, Máquina de gêneros foi o texto que apresentei na defesa de minha livre-docência em 2000, logo, refere um trabalho terminado há exatos 20 anos, mas desenvolvido ainda há mais tempo. Espero que a sua reedição tanto tempo depois signifique que tocou problemas relevantes da crítica literária, os quais ainda parecem suficientemente bem formulados ali. E, para resumir, o que está formulado ali é que os gêneros retóricos e poéticos são muito mais do que uma simples formalidade da expressão literária; mesmo ao contrário disso, compõem uma inteira estrutura determinante para os sentidos mais profundos dos textos literários ali estudados.
Para essa nova edição, o texto foi atualizado?
Nada. Está tal e qual, com apenas a correção de pouquíssimas gralhas.
"Máquina de gêneros" resulta de sua tese de livre-docência apresentada à Unicamp em 2000. A obra parece pertencer a uma longeva tradição dos estudos de gêneros retóricos-poéticos. Nela, há forte presença de gêneros comuns durante o nosso período colonial, entre os séculos XVI e XVIII (cartas, sermão, tratado, rondó, madrigal, máximas). Como foi o processo de escolha dos gêneros e autores que compõem "a máquina"?
Basicamente, tratava-se sempre de entender como a força da atuação histórica de determinado texto guardava estrita relação com o gênero retórico-poético empregado. Por exemplo, no caso de Vieira e Camões, investiguei como a escolha do sermão e da epopeia articulava a mesma configuração de um Estado católico imperial. No caso de Castiglione e Della Casa, interessou-me a relação íntima entre o gênero e o estabelecimento de um tipo de "homem ideal" para determinada geração histórica. No caso de La Rochefoucauld, tentei perceber porque a forma breve se ajustava a um tipo de produção que decretava o fim de determinado regime histórico. E assim em relação aos demais autores e gêneros.
Há outro projeto seu em andamento nessa mesma linha de pesquisa que possa resultar em novo livro?
Depois disso, estudei longamente o gênero do panegírico fúnebre, que havia deixado de lado no Máquina de gêneros porque eu estava trabalhando num texto ainda inédito de um governante baiano do século XVII, cuja transcrição impediria que eu o terminasse a tempo para a defesa. Mas isso saiu num livro posterior, que fiz em co-autoria com o brasilianista Stewart Schwartz, da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Pulando bastante no tempo, ultimamente, tenho me dedicado mais ao estudo do gênero dramático, tal como efetuado por autores paulistas, nos anos 60 do século XX. Nessa área, acabei de finalizar um longo estudo da produção teatral de Plínio Marcos.
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